Setembro
de 1981.
Lia
o Jornal de Notícias na sala de estar da casa dos meus sogros na Madalena, Vila
Nova de Gaia e ao deparar-me, na página dos anúncios, com uma proposta de
emprego que se enquadrava dentro do meu perfil não hesitei e respondi,
candidatando-me imediatamente.
De
forma um tanto inesperada, e passados poucos dias, fui convocado para uma
entrevista que ocorreu nos escritórios de uma casa da Rua da Restauração, no
Porto.
Apresentei-me
no local à hora marcada de forma perfeitamente descontraída e com o “à vontade”
de quem não dá grande importância ao caso. Diante de três altos funcionários da
empresa de alimentos para animais do Distrito de Aveiro que tinha colocado o
dito anúncio fui submetido a uma bateria de testes de características mais técnicas e a um interrogatório oral
em Português e em Francês.
Respondi,
mais ou menos, do seguinte modo:
-
Sou Bernardino Fonseca, nome que o meu pai me deu, recalcando o do seu próprio
pai que se chamava António Bernardino da Fonseca.
-
Nasci em 1953. Cresci dividido entre Pinhal do Douro e Vila Flor, dos Concelhos
de Carrazeda de Ansiães e Vila Flor, do Distrito de Bragança.
-
Ainda hoje, apesar da minha idade, 28 anos, procuro crescer todos os dias quer
seja no trabalho, na família ou com os amigos, mas se calhar não o
suficiente para chegar aos calcanhares daqueles que mais admiro. Que são muitos.
-
Sou apaixonado pela família, por livros, música e imagino-me como escritor
desde pequeno e é isso que tenciono fazer um dia.
-
Estudei Em Vila Flor, Mirandela e Coimbra onde tirei o Curso de Engenheiro
Técnico Agrário (antigamente chamado de Curso de Regente Agrícola).
-
Hoje, como Professor de Ciências da Natureza e Biologia vejo-me numa profissão
pouco ou nada relacionada com a minha formação de base e agarrado, em segredo,
nos meus tempos livres aos meus sonhos de trabalhar na minha área de formação
de base e a de um dia vir a ser um escritor reconhecido.
-
Gosto de quem sou, um pouco desinserido mas feliz e luto por mim, pela minha
família, sobretudo pela minha filha nascida há poucos dias. Luto e lutarei por
isso na totalidade, mental e fisicamente.
-
Sou algo aéreo e distraído e não se admirem se um dia ao passar mesmo junto a
vocês não vos cumprimente ou se num outro dia qualquer vos cumprimente na rua atirando-vos um sorriso patético. A não ser que tenha
ido ao dentista. Nesse caso devo preferir ser antipático do que babar-me pelo
canto dormente da boca.
A
descontracção e até a forma irónica como respondi (sem me rir) pelos vistos
caíram bem aos entrevistadores e, em consequência, fui de novo contactado. Desta
vez, para me comunicarem que, se eu quisesse aceitar as condições que me
propunham, tinha o lugar à minha disposição e poderia ocupar a vaga a partir do
primeiro dia do mês de Outubro.
E
essas condições eram para mim, naquela época, verdadeiramente extraordinárias.
Triplicava o vencimento que auferia enquanto professor provisório mais as
ajudas de custo para refeições e deslocações e combustível para o automóvel da
empresa que me seria distribuído no primeiro dia de trabalho.
Pedi
uns dias para ponderar.
A conjuntura pessoal e familiar falou mais
alto. Tinha regressado a Vila Flor no ano anterior logo depois do casamento e a
Amélia tinha deixado a sua terra, a sua família, os seus amigos e a sua escola
para me acompanhar. Vivíamos numa casa situada mesmo do outro lado da
Avenida onde ficava a Escola onde tinha sido colocado recentemente. A nossa
filha tinha acabado de nascer.
Enfim, atendendo a todas estas condicionantes, agradeci a oportunidade e... disse não!
E pronto. Foi assim que recusei o meu
emprego de sonho.
E recusaste muito bem, senão...bem, senão não estavas, orgulhosamente, a escrever de tão leve, mais um,bela "passagem" da tua vida.
ResponderEliminarMAFreire
Nunca me arrependi de ter recusado esta oportunidade de trabalhar na minha área. Apesar de ter perdido muito em termos materiais ganhei muito mais a todos os níveis. Sem esquecer que fui trabalhar na escola onde encontrei um Presidente do Conselho Directivo que muito me ensinou, sobretudo aos sábados de manhã... onde me queria (e colocava) sempre. Belos tempos!!! Um abraço
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