No dia-a-dia de cada um de nós
acontecem coisas aparentemente estranhas que, por vezes, nos parecem normais de
suceder. Nenhuma dessas coisas é igual a outra, mas quase nunca damos por elas,
ou não as valorizamos de forma conveniente, porque provavelmente acontecem frequentemente.
É isso que as torna iguais, apesar de diferentes. Ultimamente, não é tão raro
assim, dar-me conta
de pequenas coisas que me tocam profundamente sobretudo com pequenos
rasgos de afecto que surgem do nada, assim como um viajante
desconhecido que sai do comboio numa estação qualquer à procura de aventura.
Numa paragem de autocarro em
Sto Amaro, Lisboa, muito próximo do Museu da Carris e perto do
Hotel Opera Vyla Galé,
onde me encontrava hospedado, o céu assemelhava-se a uma cinzenta aguarela com
nuvens de diversas formas e vários tons de cinza sobrepostos em diferentes
camadas e deixava cair pequenas gotículas a que normalmente chamam de “chuva de molha-tolos”. De repente, uma mulher, vendo-me
assim desprotegido e com a careca exposta encostou-se discretamente a mim e
dividiu o seu guarda-chuva comigo. Ficou ali a segurá-lo, protegendo-me da morrinha que ia caindo, como se isso fosse a
coisa mais normal deste mundo. Mas não era. A normalidade também depende da
estatística e eu não via mais ninguém a dividir o guarda-chuva com um
desconhecido qualquer. Esse dia foi ontem, 20 de Abril de 2014 – dia de Páscoa
e deslocava-me para o estádio da Luz na expectativa de ver o Benfica sagrar-se
Campeão nacional de futebol, em jogo a disputar com o Olhanense.
Ela não disse nada. Nem sequer
uma palavra. Eu, no fim, só disse uma. Obrigado. Depois vi-a sair perto da
estação de Campolide e continuei no autocarro a acompanhar o seu
percurso enquanto ela se dirigia a passos largos para não perder o comboio, que se
dirigia para o Sul.
Peguei no bloco de notas e
escrevi estas linhas para não me esquecer destes pormenores. Veio-me,
entretanto, ao pensamento um acontecimento análogo que visionei na minha última
viagem de comboio que fiz de Valadares para a estação de São Bento, no Porto. Depois
de me sentar confortavelmente no meu lugar reparei que no banco da frente seguiam
duas pessoas. Pareciam mesmo um casal. Ele dormia com a cabeça pousada no ombro
dela, enquanto ela olhava pela janela como se analisasse ao pormenor uma
pintura qualquer.
Ela acabou por sair numa das paragens
mais próximas, mais precisamente na estação das Devesas-Gaia. Não sem antes lhe
ter afastado cuidadosamente a cabeça e pousado para trás, como se estivesse a
mudar de sítio uma frágil peça de louça de porcelana. Depois levantou-se e saiu
em silêncio enquanto ele lhe pediu desculpa, ainda estremunhado. Afinal não
eram um casal. Não se conheciam de lado nenhum, mas ele adormecera no ombro
dela e ela deixara-se estar ali, tão quieta como uma mãe leoa que protege a sua cria.
Acontecem coisas
estranhas nos dias normais.
Normais?
Interroguei-me.
Penso assim por ser
dia de Páscoa? Ou porque o Benfica se sagrará provavelmente campeão nacional
neste dia?
Mas, de facto, é um
dia que também tem as 24 horas do costume. Portanto é um dia normal.
Uma das coisas mais
estranhas que me acontece a mim é quase nunca dar pelas coisas estranhas que
acontecem em dias normais.
Ou das coisas
normais que acontecem em dias estranhos.
Uma coisa é certa. Se eu fosse capaz de reparar todos os dias nas mulheres que têm a coragem de salvar o dia de um homem, tenho a certeza que os meus dias seriam diferentes. Mais estranhos e mais normais. Certamente melhores.
Nota: Este dia “normal”
acabou bem e, estranhamente, dei por mim no Marquês de Pombal, em Lisboa, a celebrar o 33º título de campeão nacional de futebol que o Benfica acabara
de conquistar .
Por tudo isso apetece-me dizer:
diga 33!
Pois.
ResponderEliminar1º - Os meus parabéns à TUA satisfação desportiva.
2.º- Gostei de te ver sem um boné desses "milhafres" a quem o meu FCP deu "carne" gratuita.
3º - Fiquei satisfeito, aliás és sempre assim, SINCERO, fiquei satisfeito dizia pelo facto de reconheceres que de facto "acontecem coisa estranhas", até esse mouros serem campeões! Vê lá tu que, devido aos "maus serviços" prestados, até tu ficaste admirado pelo "feito", concordo contigo. Ah ah ah .
1 grande abraço Bernardino.
MAFreire
:-) Agora fizeste-me sorrir com gosto. Tu bem sabes que as coisas estranhas que referi aconteceram todas fora do campo e fora da Catedral. Mas, também concordo contigo quando referes que este ano o teu FCP deu "carne" gratuita, por isso, perdeu. De facto, só ganhou nos anos em que deu "fruta"!!! eh eh eh. Falando a sério: o Benfica foi melhor este ano. O Porto o ano passado ganhou sem saber bem como. Em anos anteriores ganhou porque foi melhor do que o Benfica. Acho que esta alternância (a continuar) é saudável e dá mais brilho a quem vence. Um abraço amigo
ResponderEliminarPara além do sorriso podes dizer bem alto: 33. Os médicos são os primeiros a pedir... :-) Um abraço
ResponderEliminarGosto por vezes de ler o que escreve sobretudo quando se dá a nostalgias.
ResponderEliminarAinda bem que repara nas mulheres com bons olhos.
A minha resposta está naturalmente condicionada pelo facto de não saber a quem estou a responder.
EliminarRespondendo genericamente diria simplesmente que a mulher é um dos resultados mais fascinantes da natureza. E como gosto e admiro a natureza tenho de ver “com bons olhos” uma das suas mais belas criações.
Depois tenho a sorte e a felicidade de ter duas mulheres em casa que me enchem de orgulho, simplesmente porque são como são… maravilhosas!!!
Por tudo isto pergunto eu: Como haveria eu de não reparar nas mulheres com bons olhos?
Aprecio muito os teus comentários e trocadilhos. E, com muita sinceridade, o estilo literário.
ResponderEliminarQuanto ao teu Benfica resta-me dar os parabéns, com todo o desportivismo. Este ano é inquestionável a superioridade do teu clube e, já que eu não posso ficar feliz com o que se passou este ano, ao menos resta-me a consolação de ver muitos amigos com um brilhozinho nos olhos
Obrigado Alexandre. Desculpa lá mas... o grande cronista és tu! Tu é que consegues, com o teu humor característico, descrever os nossos passeios gastronómicos de forma exemplar sob o ponto de vista literário e, ainda por cima, com uma visão fotográfica que, às vezes, nem as nossas máquinas fotográficas conseguem captar. Quanto à vitória do meu Benfica, é apenas uma gota no oceano de vitórias conquistadas nos últimos anos pelo teu FCP!!!
EliminarUm abraço