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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Conto: Neto de um emigrante em Paris! (XVII)

Zeferino andava triste. Passou os dias seguintes numa grande apatia e a pensar na incerteza do seu futuro.
Como autodefesa pensava que devia aproveitar esta experiência com Emeralda para se tornar num cidadão mais forte, mais sólido e mais resistente aos imprevistos da vida. Talvez Emeralda tenha aparecido na hora certa, no lugar certo e se tenha ido embora no momento perfeito. Quem sabe? Quem sabe se não foi melhor assim quando ainda ficou tudo de lindo no ar e todos os mistérios por revelar. Sem terem ainda reconhecido nenhum defeito tal como num belo quadro na parede de uma galeria de arte.

Esta relação fica assim feita de suposições, de imaginação, doces lembranças e muitos sonhos.

E Zeferino pensava para si procurando animar-se: o amanhã pode ser muito incerto, isso é certo, mas não posso perder a esperança e tenho de continuar a procurar a felicidade.
E será que houve mesmo um amor de verdade entre nós ou apenas o carinho de uma sensual amizade?
O que ficou, isso sim, foi este sentimento confuso e difuso que o acompanhou para todo o sempre.
Lembrou-se de retribuir o gesto de Emeralda. Escrever o seu sentir e deixá-lo no Café Le Pré aux Clercs, na esperança de que ela um dia também fosse lá e tivesse a oportunidade de o ler para, finalmente, ficar a saber as razões pelas quais ele não pode comparecer ao encontro.
Assim decidido, deixou ao mesmo empregado de balcão e dentro de um envelope uma mensagem de 15 páginas (!) redigidas com fervor e paixão tendo-a iniciado com uma citação, também de Pablo Neruda, para retribuir de  forma significativa e simbólica mas sobretudo por lhe parecer a mais adequada e perfeita para melhor explicar os seus sentimentos:

"Já não se encantarão os meus olhos nos teus olhos, 
já não se adoçará junto a ti a minha dor.  
Mas para onde vá levarei o teu olhar
e para onde caminhes levarás a minha dor.  

Fui teu, foste minha. O que mais? Juntos fizemos
uma curva na rota por onde o amor passou.  

Fui teu, foste minha. Tu serás daquele que te ame,
daquele que corte na tua chácara o que semeei eu.  

Vou-me embora. Estou triste: mas sempre estou triste.
Venho dos teus braços. Não sei para onde vou...

Do teu coração me diz adeus uma criança.
E eu lhe digo adeus."

E depois continuou dizendo que as palavras que lhe deixava eram as palavras que sempre existiram no fundo do seu ser e que estariam prontas a saírem no dia em que a encontrasse nessa encruzilhada que é a vida e no dia em que as circunstâncias (ou o destino?) os colocassem frente a frente ou a trilhar o mesmo caminho. Como, aliás, tinha acontecido nesses últimos dias, sem anunciar, sem esperar.
Zeferino continuou num longo desabafo: "Emeralda, tu foste aquela que eu via sem rosto quando te procurava em vão, perdido nas tempestades dos meus pensamentos mais íntimos e que me deixavam vazio, sem te encontrar e sem mais saber de mim.
Depois, surgiste... Assim de surpresa, no meio duma viagem e das «entrelinhas» de um comboio internacional. Ao fim da tarde e enquanto o sol se punha mas que reflectia o teu rosto por entre as folhagens espessas das árvores que passavam pela janela do comboio"
"Mas fez-se luz!"    "(...)"
"...fizemos acontecer o milagre e tocámo-nos." "...olhámo-nos nos olhos, mergulhámos nos nossos mares, e nesse mesmo instante soube que serias minha."
"...Mais tarde, no preciso momento que resplandeceste em mim por entre duas brilhantes estrelas, que passaram de repente pela mesma janela, eu bebi do teu rosto num beijo, entraste-me na minha alma e disseste: Zefe, beija-me mais e mais!
Selámos o nosso amor com o sal dos nossos olhos, com o gosto dos nossos lábios e com o calor dos nossos corpos.
Se escrevo estas linhas agora e não antes, não é para que saibas que te amo, nem para me rearfirmares o teu amor. Isso sentimos os dois desde o primeiro instante...
Todos os poetas cantaram o amor, mas só quem o sente e o vive lhe entende o sentido, lhe sabe a dor com que o fogo corta o peito, o doce da entrega e o amargo que castiga as almas com as ausências.

Estas linhas simples são apenas um grito ao mundo, para que ele desperte e durante uma breve paragem do tempo se dê conta que existimos. 

Que seja também um anúncio do nosso amor que segue viagem, nesta viagem que é a vida...". 
 (continua...) 

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